24 de janeiro de 2012

Uma linda declaração de amor de um filho para seu pai

Uma das mais belas declarações de amor de um filho para seu pai que já li. Uma carta linda e comovente. Tenho orgulho de ser amigo dos dois: do Saint-Clair, o pai; e do Pedro, o filho, autor da lindíssima carta. Tal pai, tal filho!

               Uma carta de chorar


Lá pelo início dos anos noventa, havia prometido a meu filho Pedro, então com treze anos, que o levaria às Olimpíadas de Barcelona.
Era um prêmio para o bom filho que sempre fora, como até hoje é, e para que ele desse vazão ao amor que tinha (e ainda tem) por esportes. Ele praticamente gostava de todas as modalidades. Era possuído por aquilo que se chama espírito olímpico, sem nunca ter manifestado, no entanto, desejo de competir em qualquer modalidade. Até mesmo na natação, que foi aprender ainda bem pequeno, jamais quis participar de competições de petizes, como era nomeada sua categoria.
Enfim, gostaria de lhe fazer esse agrado. Então comecei a poupar na caderneta. Assalariado tem de fazer assim, se quiser algo.
Em determinado momento de nossas vidas, ocorreu-nos a tragédia Collor de Mello. O confisco da poupança e dos depósitos bancários, promovido pela ensandecida ministra Zélia Cardoso, acabou frustrando os planos.
Contudo, em seguida, anunciou-se a Copa do Mundo da FIFA na França para 1998. Renovamos as intenções e comecei novamente a programação.
Como não seria possível ficar durante todo o decorrer da competição, optamos por assistir aos jogos a partir das oitavas de finais. Assim excluímos a primeira fase, com a certeza de que a seleção brasileira se classificaria para as próximas. Chegou, mas foi aquela tragédia que todos sabem muito bem.
Voltamos da França cheios de histórias para contar e, se por um lado tristes com o resultado final, por outro, felizes pela viagem, pelo prazer de estar um com o outro vinte e quatro horas, pela curtição de cada lugar, de cada restaurante, de cada taça de cerveja (ele já tinha dezenove anos), de cada jogo, de cada passeio.
Passados alguns meses, por ocasião de meu aniversário, recebi a carta que transcrevo a seguir, a qual não consigo ler ainda hoje, sem que mine água nos meus olhos, pela beleza da mensagem, pela sensibilidade que ele demonstrou, pela criatividade, enfim. Hoje ele é um publicitário competente.
O envelope estava a mim endereçado. No remetente, aparecia: Emilie Merchant, Rue Louis XV, 8 – Paris – France – CEP 11033-110.
Quero que observem que, no último parágrafo, já começa a haver a contaminação do personagem que ele criou com ele mesmo. Transcrevo então.
“Olá, como vai o senhor?
Provavelmente o senhor está estranhando esta carta e também a sua remetente, mas tudo bem. Mesmo assim eu precisava lhe escrever para dizer o quanto foi prazeroso conhecer e conviver, mesmo que por apenas curtos vinte dias, com o senhor e o seu filho.
Meu nome é Emilie e fui sua arrumadeira aqui em Paris durante a Copa do Mundo. Na verdade esta carta já era para ter sido escrita, mas o senhor sabe né? Os lençóis e travesseiros ocupam muito tempo do meu dia e aí…
Não sei se é uma característica de vocês brasileiros, mas fiquei simplesmente admirada com a relação de amizade e confiança entre o senhor e o seu jovem filho, que me pareceu ser completamente apaixonado pelo pai, pois pude reparar em seus orgulhosos olhos acompanhando os passos do senhor, tentando segui-los e copiá-los em uma declaração de carinho infinito. Isso era muito bonito. Olhos esses que também choraram de prazer e frustração e que foram amparados prontamente pelos braços acolhedores de seu pai amigo. Abraços, abraços e mais abraços! Abraços intermináveis de dois camaradas que se conhecem bem e compartilham os mesmos sonhos. Ah, grandes sonhos!!!
E os sorrisos? Esses sim eram de verdade, sim senhor! Me desculpe a intromissão, mas não pude me conter com as longas gargalhadas de vocês, principalmente as do senhor, que, quando não ultrapassavam as paredes do  quarto, ficavam latentes no coração e tímidas no canto da boca esperando a próxima bobeira do jovem para explodir e contagiar quem estivesse em volta.
Nas longas caminhadas pelas ruas de minha cidade, nas pequenas aulas perante um monumento qualquer, nas lembranças da viagem anterior, nas brincadeiras no metrô e nos estádios do meu país. Em todos estes cantos eu também estava lá e vi estas cenas de coleguismo que me mostraram uma relação antiga e eterna de pai e filho. De um pai coruja (é assim que vocês falam no Brasil?) e de um filho orgulhoso. Vocês são reais, de verdade mesmo!
O senhor é uma pessoa especial no que faz, no que diz e até quando não diz e dá a ver ao outro. É o espelho para seu filho (imagino que para todos de sua família) que, secretamente, me confidenciou lá no quartinho de roupa suja que o senhor era um roncador de marca maior e por isso eu não deveria me assustar ao chegar próximo ao quarto. Que sacanagem!
Então vou ficar por aqui, pois o trabalho me chama e preciso continuar a observar as pessoas que passam por Paris. Obrigada por ter vindo e por ter trazido seu filho. Obrigado pelos dias, tardes e noite. Obrigado pelo café da manhã (não era um Méridien!), pela cerveja no almoço e pelos lanchinhos noturnos nas máquinas daqui do hotel. Obrigado pela parceria nos estádios, pelos sorrisos e pelo abraço amigo diante da TV durante o Hino Nacional que me deu forças para engolir o choro. Choro que me volta aos olhos agora, quando escrevo esta carta, e sempre que me lembro. Obrigado por ser meu pai, de Pituquinha e de Sheilinha. Obrigado por ter me dado Janinha! Obrigado por ser você e parabéns pelo dia de hoje, meu amigo!
Um beijão.”
E assina a carta, que está impressa: Pedrão.
E eu, na qualidade pai coruja, como a própria Emilie constatou, pergunto a você: é possível reler esta carta sem que mine água nos olhos?
(Pituquinha é o apelido carinhoso de sua irmã; Sheilinha é sua prima, à época morando conosco; Janinha é sua mãe, Jane.)



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